sábado, fevereiro 18, 2006

Descuidados de saúde

O direito à saúde é um dever social do Estado estabelecido no art.º 64.º da Constituição da República. O Estado deve promover esse direito através de “um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito”.
Sendo certo que os cidadãos com maior capacidade económica, com um sistema de assistência médica diferente do da segurança social, ou com um seguro de saúde próprio, são os que menos recorrem aos cuidados do Serviço Nacional de Saúde (SNS), não nos podemos esquecer que os mais carenciados, sobretudo os mais idosos, são aqueles que mais necessitam desses cuidados e da proximidade dessa assistência.
A face mais visível do SNS para o cidadão é constituída pelos Centros de Saúde, onde o doente espera um cuidado próximo, feito por um médico que o conhece, e que tantas vezes é decisivo para que encete uma rápida recuperação sem ter de se afastar consideravelmente do seu meio social e da família.
Conscientes destas preocupações, os murtoseiros centraram na Santa Casa da Misericórdia a expressão da sua solidariedade dando corpo a um Centro de Saúde, na altura moderno, bem equipado e eficaz para a população que abrangia.
Com o passar dos tempos, o resultado dessa vontade popular foi assumido pelo Estado que parecia ser capaz de assegurar o direito de todos à saúde.
Aquilo a que temos vindo a assistir recentemente é, no entanto, preconizador da cedência absoluta do Estado à lógica puramente económica e de abandono das necessidades essenciais dos doentes, sobretudo dos que mais dificilmente terão uma melhor solução à sua disposição.
Tomando opções quanto a mim de duvidosa eficácia, e perseguindo certamente objectivos transversais ao interesse dos cidadãos, ainda que aparentemente com o intuito de os servir, o Estado permitiu e apoiou a criação de extensões de saúde que foram e serão um passo evidente para o desmembramento total dos cuidados de saúde no Concelho.
Ao que parece, não faltará muito para que o Serviço de Atendimento Permanente (SAP) na Murtosa, que já hoje funciona com algumas intermitências, deixe de garantir os cuidados de saúde durante as vinte e quatro horas do dia.
Perguntar-se-á então o que é mais importante para o Concelho: ter três centros de atendimento a funcionar apenas a algumas horas do dia, ou possuir uma única estrutura que funcione 24 sobre 24 horas, 365 dias por ano?
Num Concelho envelhecido como o nosso, e olhando a algumas atitudes que vão conquistando força dia após dia, antevejo com preocupação que no futuro próximo se vão agudizando sucessivas dificuldades na obtenção dos cuidados de saúde primários sobretudo para aqueles que não têm capacidade de se bastar a si próprios.

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